quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Economia para quem cria

Com uma nova secretaria de governo, a discussão sobre economia criativa ganha espaço no Brasil – enquanto grupos e coletivos descobrem novas formas de produzir cultura, viabilizada pelas dinâmicas da rede.


Na teoria econômica de Adam Smith aprende-se que o valor produzido em atividades culturais se esvai no mesmo momento de sua produção. O fato de não haver circulação de valor tangível em manifestações artísticas e culturais colocaria, portanto, a cultura em um espaço quase “à parte” da economia. Mas, apesar do conselho do velho Smith, a Organização Internacional do Trabalho realizou pesquisas para medir a participação dos bens e serviços culturais no PIB mundial – já representam 7% desse patrimônio, com previsões de crescimento anual que giram em torno de 10% a 20%. E, com números como esses a vista, traçar uma relação entre cultura e mercado torna-se quase inevitável.

A economia criativa trata dos processos de criação, produção e distribuição de bens imateriais e simbólicos. Na sua concepção original estava diretamente ligada à questão dos copyrights, os direitos de propriedade dos autores desses bens sobre aquilo que produziam, fechando um ciclo de geração e aproveitamento de valor.

Mas o conceito sofreu alterações de acordo com a transformação das cadeias produtivas de bens culturais. Num passado recente, a mudança vinha do estabelecimento de uma poderosa indústria cultural, que atua como intermediária (e muitas vezes concentradora) da circulação do valor produzido em torno da cultura. Hoje, vem também da multiplicação e do barateamento das formas de produção e distribuição de bens imateriais, baseadas nas tecnologias digitais e na internet.

Segundo a economista Ana Carla Fonseca, fundadora da consultoria Garimpo Soluções – Economia, Cultura e Desenvolvimento, a economia criativa usa o conhecimento dos processos econômicos para jogar luz sobre gargalos não resolvidos da atividade cultural: “A cultura, como outras atividades produtivas, tende a um fluxo de distruibuição e circulação orientado pela demanda. O Brasil se caracteriza por uma produção muito vasta de bens culturais, mas com distribuição escassa e com demanda muito menor. Se você diminui a produção, perde em identidade e diversidade cultural. Então, é preciso melhorar a distribuição e ampliar a demanda”. Ela lembra que, com as mídias digitais, novos modelos de produção e distribuição são criados, o que não significa, necessariamente, que as pessoas vão consumir mais cultura. “É preciso resolver a ponta da demanda, e isso se faz com formação de novos hábitos, com a geração de consciência crítica. Existe diferença entre ter acesso às mídias digitais e conseguir decodificar informação em conhecimento.”

É fato que a cultura virou um mercado importante internacionalmente. Segundo dados da Unesco, o comércio mundial de bens e serviços culturais cresceu de US$ 39 bilhões em 1994 para US$ 59 bilhões em 2002. Por enquanto, esse fluxo está concentrado nos países desenvolvidos, responsáveis por mais de 50% das exportações e importações – e essa realidade aponta oportunidades a serem exploradas pelos países em desenvolvimento. Por outro lado, especialmente no Brasil, a questão da produção e distribuição de bens culturais está ligada à proteção da diversidade do riquíssimo patrimônico cultural do país, e também à ideia de fruição e de acesso a conhecimento e cultura. De forma que as propostas advindas da economia criativa – principalmente por sua ligação com a lógica de mercado – inspiram discussões bastante acirradas.

Desde janeiro de 2011, quando Ana de Hollanda assumiu o Ministério da Cultura, a proposta de trabalhar a cultura como um vetor para o desenvolvimento ganhou espaço no governo, culminando na criação da Secretaria de Economia Criativa (SEC), sob o comando da secretária Cláudia Leitão. Apesar de já estar em funcionamento desde o começo do ano, a SEC necessita ainda de decreto presidencial para ser finalmente institucionalizada. “A institucionalidade é muito importante dentro do Estado, pois facilita a ação, o contato com a população, o relacionamento com outros ministérios e outros setores do MinC”, afirma Cláudia.

Daniela B. Silva

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